sexta-feira, 29 de abril de 2011

Tremo... Não de frio

Olhei-me no reflexo do vidro do autocarro, parado. As horas passavam tão devagar, que parecia um inferno. Estavam cerca de 5ºC, o meu nariz gelava, e as minhas mãos pareciam blocos de rocha, pronta a partir. No entanto, o frio não me afectava muito. Estava embrenhada em pensamentos distantes, e nada do que se passava à minha volta me era familiar. Algo me fez voltar à realidade. O condutor do autocarro pusera o motor a trabalhar. Agora sim, sentia frio. Entrei, paguei o bilhete e sentei-me num dos bancos que ficava lá atrás, encostada ao vidro. Não consegui evitar a fuga de uma lágrima quando me lembrei de ti. Como seria possível que fosses tão cego ao ponto de não teres percebido? E eu... Como seria possível que tivesse sido tão estúpida ao ponto de ainda acreditar que algo poderia mudar? Como seria possível que eu ainda acreditasse que poderia ser alguém com valor? Alguém a quem tu pudesses dizer "Tenho orgulho em ti"? Enganei-me. Olhaste para mim com um olhar frio, e gozaste comigo. Eu sei que gozaste! Não mo mostraste, apenas por pena, ou desprezo, mas uma gargalhada muda morreu no teu peito, pois nem te deste ao trabalho de me mostrares esse sentimento de repulsa que tinhas para comigo.
Fugi. Sim, fugi. Não suportava mais olhar o teu rosto de distância e desinteresse. Amei-te, sim, e tu sabes bem disso. Mas aquele banco de autocarro parecia agora um refúgio. O herói que me iria afastar de ti. O passaporte para um destino desconhecido, ainda por traçar. Só queria fugir dali. Apenas queria nunca mais ter de olhar para a tua cara, apenas queria nunca mais gostar de ti.
Acordei. Tinham passado pelo menos três horas, e o autocarro parava agora num local que me era completamente indiferente. Desci e decidi começar a andar. Não tive paciência para me informar do sítio onde viera parar. Apenas estava ali para esquecer, e era isso que faria. Andei dezenas de quilómetros, e quando as minhas pernas não suportavam mais a tremura do meu corpo, sentei-me. Pus a cabeça entre os braços e chorei sem vergonhas. Não tinha de me esconder de ninguém. Afinal, estava num sítio onde ninguém me conhecia, ninguém me julgaria, nem perguntaria o que se passava, se estava mal ou bem.
"Obrigado", ouvi. Aquela voz não me era estranha, e um arrepio percorreu-me todo o corpo antes que pudesse olhar para cima, para ver quem seria aquela pessoa desconhecida. Não precisei de o fazer. O vento encarregou-se de trazer até mim o teu cheiro. Não podia ser. Não queria que fosse. Não deixaste que me levantasse. Deste-me um daqueles teus beijos. Aqueles beijos que há muito tempo não sentia roçarem-me a face. Naquele momento, o meu coração queria perdoar-te. Queria apenas que me entregasse nos teus braços, como era meu desejo. Mas o rancor falou mais alto. Olhei-te nos olhos, e as únicas palavras que me vieram à cabeça, sairam, involuntariamente pela minha boca, enquanto virava as costas para voltar a fugir. "Eu amei-te. Amei-te verdadeiramente."
A verdade é que não sei. Gostar de ti? Acho que tudo ficou mal explicado. Ou nada ficou bem. A verdade é que ainda sinto o aroma do teu perfume na minha face, como se estivesses agora mesmo ao meu lado. Mas não estás, pois não? Então...

Porque não sais do meu pensamento, e me deixas o caminho livre para ser feliz?


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