terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Rasga-me

Pega-me como um pedaço de papel e rasga-me. Escreve em mim e depois rasga-me. Apaga-me com essa borracha cruel e rasga-me. Desenha-me em ti. Coloca cada pequeno traço do meu rosto, para me lembrares a sorrir e a chorar... Mas depois rasga-me. Não me recortes com uma linha perfeita que descreve uma bela figura. Não me dobres ocultando cada letra que há em mim. Não pegues simplesmente em mim e não me amarrotes, com esse desprezo no olhar de quando algo não vale nada. Rasga-me. Escolhe o sítio perfeito por onde começar, e vai continuando, por ali abaixo, devagar. Ou depressa. Com serenidade ou com toda essa raiva que tens por mim. Rasga-me. Quando me tiveres rasgado como este pequeno pedaço de papel uma vez, rasga-me outra e outra vez. E verás que o pequeno pedaço de papel se transforma em muitos pequenos pedaços de papel moldados por ti. Mais pequenos, mais desalinhados, com bordas feias, mal definidas, de diferentes tamanhos. Mas continua a rasgar-me. E verás que um dia não conseguirás rasgar mais. Os pequenos pedaços de papel vão-se tornando tão pequenos que não consegues rasgá-los mais. Toda eu continuarei aqui, apesar de feita em pequenos pedaços de papel. E tu? O que farás com esses pequenos pedaços de papel impossíveis de rasgar? Deitá-los fora? Ou continuar a guardá-los nessa caixinha inquebrável que tens dentro do peito?..

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